O Teatro em Portugal e no Brasil: do Humanismo ao Romantismo


Neste texto, pretendemos apresentar as estéticas literárias, os autores e as principais peças pertencentes ao teatro desenvolvido em Portugal e no Brasil ao longo dos séculos XV a XIX.

1. HUMANISMO

O Humanismo (1434-1527) corresponde à fase de transição entre a Idade Média e a Renascença, e foi marcado pela valorização do homem e pela exploração da poesia palaciana e do teatro popular. É nesse período que surge em Portugal, inserido no contexto das grandes descobertas e ao mesmo tempo do ambiente medieval, Gil Vicente, dramaturgo responsável por modificar o teatro no país – que até então não cultivava produções teatrais em língua vernácula –, dividindo a dramaturgia em antes e depois de sua aparição (ABDALA; PASCHOALIN, 1985). O teatro vicentino, iniciado com o Auto da visitação ou O monólogo do Vaqueiro, fez uso de elementos populares, da crítica social e da mistura do cômico e religioso. O representante do Humanismo no teatro é, portanto:

Gil Vicente (1465-1536): considerado o fundador do teatro em Portugal, com a obra Auto da Visitação ou Monólogo do Vaqueiro (1502); produziu quarenta e seis peças, entre comédias, farsas e moralidades. Suas principais obras são: Trilogia das Barcas (1518), a Farsa de Inês Pereira (1523) e o Auto da Alma (1518).

 

2. CLASSICISMO

Com o fim do velho sistema, instaurou-se um novo ideal artístico em Portugal, baseado na cultura dos gregos e latinos. O teatro do Classicismo (1527-1580), opondo-se voluntariamente ao vicentino, buscou, então, inspiração na Antiguidade Greco-Latina, principalmente em Plauto, Sêneca e Terêncio (MASSAUD, 1990). Mas ainda assim, segundo Abdala e Paschoalin (1985), o teatro português do século XVI, caracterizou-se pela influência não só da cultura clássica, mas também da escola vicentina, apesar de não conseguir se manter no mesmo nível desta. Foi com a publicação de Os Estrangeiros, de Sá de Miranda, que o teatro desse período foi inaugurado em Portugal, que teve como principais representantes:

              Antônio Ferreira (1528-1569): introdutor da tragédia em Portugal, com a peça Castro (1587); escreveu duas comédias: Bristo (1622) e Cioso (1622);

              Jorge Ferreira de Vasconcelos (1515?-1585?): escritor de comédias. Suas principais obras são: Eufrosina (1555), Ulissípo (1547) e Aulegrafia (1548-1554).

              Sá de Miranda (1481-1558): inaugurou o teatro clássico português com a comédia Os Estrangeiros (1526); produziu também Os Vilhalpandos (1538);

No Brasil, as primeiras manifestações cênicas ocorreram durante o Quinhentismo (1500-1601), com os padres jesuítas, que fizeram do teatro uma ferramenta de catequese. O Quinhentismo corresponde ao período em que surgiram as primeiras manifestações literárias no país, desenvolvidas no início da colonização. No teatro, o maior expoente dessa fase é o padre José de Anchieta, o qual procurou transmitir os mandamentos religiosos através de autos sacramentais, influenciado pelo teatro vicentino (MAGALDI, 2004).

              José de Anchieta (1534-1597): padre jesuíta; primeiro escritor a produzir peças com regularidade no país. Entre as diversas obras desenvolvidas, destacam-se: o Auto de São Lourenço (1583) e o Auto da Pregação Universal (1561).

 

3. BARROCO 

Durante o século XVII, o teatro em Portugal entrou em decadência: com exceção da obra o Auto do Fidalgo Aprendiz, de Francisco Manuel de Melo, todas as produções teatrais do Barroco (1580-1756) resultavam em imitações de Gil Vicente ou em representações de caráter pedagógico e religioso. Esse quadro só foi revertido no século XVIII, com a aparição do brasileiro Antônio José da Silva, o Judeu (MASSAUD, 1990; SARAIVA; LOPES, 1996). A estética barroca caracterizou-se pela tentativa de fusão harmônica das contradições, reflexo do duelo de duas forças ideológicas vigentes na época: o espírito cristão e o renascentista (ABDALA; PASCHOALIN, 1985). Na dramaturgia, os representantes desse período são:

              Antônio José da Silva – o Judeu (1705-1739): desenvolveu obras denominadas como “óperas”, que possuíam acompanhamento musical. Suas principais peças são: Guerras de Alecrim e da Manjerona (1737), Esopaida (1734) e Encantos de Medéia (1735);

              Francisco Manuel de Melo (1608-1666): escritor de obras variadas, destacou-se na dramaturgia com o Auto do Fidalgo Aprendiz (1646).

Durante os séculos XVII e XVIII o Brasil passou por um “vazio teatral”, em decorrência das condições sociais e das invasões que o país enfrentou nesse período (MAGALDI, 2004). Ainda assim, segundo Cafezeiro e Gadelha (1996), o teatro não foi esquecido nessa época, o fato é que muitos intelectuais, por não poderem ter suas obras publicadas no país, transferiram-se para a Metrópole ou produziram peças voltadas ao exterior. É o caso de escritores como José Borges de Barros (1657-1719), que se mudou para Coimbra, e Manuel Botelho de Oliveira (1637-1711), o primeiro comediógrafo brasileiro, que produziu apenas obras em espanhol, não sendo incluído na dramaturgia nacional por esse motivo. Portanto, não é possível apontar representantes de teatro no Barroco brasileiro (1601-1758).

4. ARCADISMO 

Em Portugal o Arcadismo (1756-1825) buscou, como reação ao movimento barroco, revalorizar os ideais clássicos e os modelos greco-latinos, como a razão, o equilíbrio e os valores pastoris (MASSAUD, 1990). Nas manifestações teatrais, em específico, os escritores da Arcádia Lusitana – academia literária similar à Arcádia Romana -, além de focalizarem em traduções e adaptações de obras clássicas e estrangeiras, fizeram grandes esforços para a criação de um teatro nacional, mas não alcançaram êxito nessa tentativa de restauração da dramaturgia, que continuava em declínio após o teatro vicentino (SARAIVA; LOPES, 1996). Ainda assim, três autores de produções nacionais podem ser destacados:

              Domingos Reis Quita (1728-1770): produziu, entre outras obras, a comédia Castro (1766?), inspirada na obra de Antônio Ferreira;

              Manuel de Figueiredo (1725-1801): principal representante do teatro neoclássico português; escreveu, entre tragédias e comédias, as obras Viriato (1757) e Lusitana (1773);

              Pedro Antônio Correia Garção (1724-1772): escreveu as comédias Teatro Novo (1766) e Assembleia ou Partida (1771).

A escassez de manifestações teatrais no Brasil durou até o início do século XIX, não sendo possível, por conta disso, indicar representantes de teatro no Arcadismo brasileiro (1738-1836). De acordo com Magaldi (2004), esse período de ausência de produções teatrais pode ser compreendido como uma preparação para o florescimento do teatro brasileiro, que ocorreria após a Independência do país, em 1822.

5. ROMANTISMO

O teatro em Portugal, que entrou em decadência após Gil Vicente, só conseguiu se reerguer no Romantismo (1825-1865), quando Almeida Garrett, ao introduzir o teatro romântico com o drama Um Auto de Gil Vicente, concretizou também a formação de um teatro de feição nacional – não limitado a traduções e adaptações de obras estrangeiras (MASSAUD, 1990). Cebulski (2012) afirma que a estética romântica, em repúdio aos ideais neoclássicos, defendeu a liberdade de criação, a abordagem de assuntos nacionais e a mistura de gêneros (como o drama, forma dramática definida por Victor Hugo e muito utilizada por Garrett). Assim sendo, o maior expoente do Romantismo luso é:

              Almeida Garrett: responsável pela restauração do teatro português e introdutor do teatro romântico, com Um Auto de Gil Vicente (1838). Entre suas obras, destacamse: Frei Luís de Sousa (1844) e O Alfageme de Santarém (1842).

O teatro romântico foi introduzido no Brasil através da representação da obra Antônio José ou o Poeta da Inquisição, de Gonçalves de Magalhães, pela companhia de teatro do ator João Caetano, organizada com o intuito de fortalecer a identidade nacional ao acabar com a dependência de atores estrangeiros no teatro brasileiro (MAGALDI, 2004). No Romantismo (1836-1881), os escritores, impulsionados pela independência do país, procuraram enaltecer uma produção literária genuinamente nacional, autônoma em relação a Portugal (CEBULSKI, 2012). Os autores que tiveram grande importância nesse período são: 

              Álvares de Azevedo (1831-1852): escreveu o drama Macário (1852), sua peça mais importante na dramaturgia;

              Castro Alves (1847-1871): escreveu Gonzaga ou a Revolução de Minas (1867), seu único texto teatral completo;

              Gonçalves de Magalhães (1811-1882): iniciou o teatro romântico ao publicar a obra Antônio José ou o Poeta da Inquisição (1838), primeira tragédia brasileira e sua principal peça;

              Gonçalves Dias (1823-1864): reconhecido pela produção teatral apenas na posteridade, teve Leonor de Mendonça (1847) como obra de maior relevância;

              Joaquim Manuel de Macedo (1820-1882): apesar de cultivar também o drama, destacou-se como comediógrafo, principalmente com A torre em concurso (1863);

              José de Alencar (1829-1877): na dramaturgia, apresentou obras com características românticas e realistas, e teve como peças mais significativas: O demônio familiar (1857), As asas de um anjo (1857), Jesuíta (1861) e Mãe (1860);

              Martins Pena (1815-1848): fundador da comédia de costumes no Brasil, com o texto O Juiz da paz na roça (1838). Suas principais peças são: O Judas em Sábado de Aleluia (1844), O Noviço (1845), Os dous ou O inglês maquinista (1871) e Quem casa quer casa (1847).

 

REFERÊNCIAS 

 

ABDALA, Júnior Benjamin; PASCHOALIN, Maria Aparecida. História Social da Literatura Portuguesa. 2. ed. São Paulo: Ática, 1985.

 

CAFEZEIRO, Edwaldo; GADELHA, Carmem. História do Teatro Brasileiro: um percurso de Anchieta a Nelson Rodrigues. Rio de Janeiro: Editora UFRJ/EDUERJ/FUNARTE, 1996.

 

CEBULSKI, Márcia Cristina. Introdução à história do teatro no ocidente: dos gregos aos nossos dias. Paraná: Editora Unicentro, 2012.

 

MAGALDI, Sábato. Panorama do teatro brasileiro. 6. ed. São Paulo: Global, 2004.

 

MASSAUD, Moisés. A Literatura Portuguesa. 25. ed. revisada e aumentada. São Paulo: Cultrix, 1990.

 

SARAIVA, Antônio José; LOPES, Óscar. História da Literatura Portuguesa. 17. ed. Porto: Porto Editora, 1996.

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